Saber e Sabor – Aprender é como comer
“Se os sonhos não fossem forças, os pesadelos não seriam tormentas”. Bachelard
Aprender é como comer e, se você não fizer isso todos os dias, de um jeito ou de outro, acaba que você não sobrevive e morre. No início da vida, frágil e sem dentes, o bebê precisa que lhe seja dado um alimento nutritivo e de acordo com sua capacidade de engolir e digerir. Então é só leite do peito, mamadeira e papinhas…Quando surgem os dentes o bebê quer mastigar e pede outros tipos de alimentos.
Na Educação Infantil se ensina de um certo jeito, no Ensino Médio é bem diferente! Se tratamos um adolescente como criança, este fica irritado, e quer ser tratado de forma diferente, pois ninguém fica bem quando seu esforço de crescimento não é reconhecido, quando vence os desafios de aprender e não é visto. O que mais queremos na vida é que nos reconheçam como seres pensantes. É muito estranho e detestamos quando já temos bons dentes e , ainda assim, a comida que nos dão é uma “sopinha” de mandioquinha batida no liquidificador!
Então, o que comer e aprender têm em comum? Quando comemos, nosso organismo realiza inúmeras operações internas indo de encontro com a necessidade de repor energia e estruturas. Comemos também porque, em geral, o sabor dos alimentos os torna muito agradáveis quando temos fome. E principalmente, quando temos fome e apetite. Fome e apetite são coisas parecidas, embora diferentes. Diríamos que fome vem do Organismo e o apetite vem do Corpo.Organismo e Corpo são processos diferentes e interdependentes.Organismo é a estrutura biológica vivente, enquanto o Corpo é a estrutura biológica preenchida de pensamentos, sentimentos, percepções, inteligência, metáforas, gestos, sonhos… Assim, podemos dizer que o ser humano tem um Organismo e um Corpo, e que um animal tem um Organismo mas não tem um Corpo, falta-lhe a consciência de si mesmo, privilégio dos humanos. Podemos dizer que o substituto do instinto do animais, nos seres humanos, é a nossa capacidade de aprender. Essa capacidade de aprender é o elemento fundante do humano.
Retomando a pergunta: o que o comer e o aprender têm em comum? O aprender e o comer são processos ativos e inconscientes. Com o aprender ocorre algo semelhante como no comer. Ao “comermos um prato de conhecimento” temos de digerí-lo, esmiuçá-lo, dissolver suas partes em novas e em nossas partes, incorporá-lo, para que possamos reconstruir nosso Corpo de Conhecimentos. Essa ação de conhecer, de transformar em próprio o que é de outro, adquirimos na relação ensinante-aprendente (professor-aluno, aluno-aluno, pais-filhos, outros). Esse jeito próprio de aprender, que chamamos de Modalidade de Aprendizagem é o jeito de entender, compreender, recordar e, de incorporar o novo conhecimento, constituindo uma das características fundamentais de nossa singularidade. O aprender um novo conhecimento, também, se processa internamente, de forma inconsciente e, o que expressamos do nosso conhecimento é uma pequena parte do que sabemos. As pessoas reorganizam o jeito de aprender, ao longo da vida, enquanto vão crescendo, desenvolvendo, amadurecendo – da mesma forma que vão mudando o jeito de comer.
O comer e aprender desenvolve nossa identidade e cria as nossas características como indivíduos e que nos diferencia de todos os demais dentro da Espécie Humana, a partir de nossas relações na família, na escola, na igreja, no local onde moramos, na cultura, na história e na afetividade. Buscarmos compreender e tomar consciência de como comemos e como aprendemos e o que comemos e aprendemos pode contribuir para nos tornar seres humanos mais saudáveis e felizes.