O espaço-tempo entre

        “ Mas é exatamente nesse espaço de fronteira que estamos aprendendo  a ser criaturas de fronteira, costureiros de diferenças e viajantes de caminhos que atravessam não outras terras, mas outras gentes”. Mia Couto 

 

    Com este título O espaço-tempo entre inauguramos algumas reflexões sobre a jovem existência do Instituto Ecos na Educação. Na verdade, podemos dizer, que estamos dando nossos primeiros passos, como uma criança que sempre está aberta e com todo o seu potencial de criatividade e aprendizagem disponível para crescer e se desenvolver diante de um mundo em  mudanças profundas. 

   Estas reflexões passam pelo feliz encontro entre o Instituto de Desenvolvimento Regenerativo (IDR) e o Instituto Ecos na Educação e os aprendizados advindos daí. Passam, também, pelo trabalho realizado pelo Instituto Ecos na Educação junto às escolas públicas da cidade de Vargem Bonita-MG e os estudos realizados a partir de textos de Paulo Freire e Antônio Nóvoa junto a um pequeno grupo de educadoras, que nos permitiu compreender nossas vivências e abrir novos caminhos para o papel a ser cumprido pelo Instituto Ecos na Educação.    

  Antes, porém, vamos nos deter um pouco sobre quem são o IDR – Instituto de Desenvolvimento Regenerativo e o Instituto Ecos na Educação. O Instituto de Desenvolvimento Regenerativo em seu manifesto de fundação diz: “… Trabalhar com a vida implica uma nova forma de ver o mundo, uma que faça as pazes com a complexidade e seja informada pela observação profunda da evolução dos sistemas vivos. Para tanto, a primeira mudança necessária é reconhecer que não fazemos parte da natureza, mas que somos a natureza. Temos de perceber, também, que não somos os seres inteligentes da Terra, mas a própria Terra em seu processo evolucionário tomando consciência de si.

Sendo natureza podemos nos afastar de uma percepção utilitarista e dominadora do planeta e nos preparar para a participação apropriada. Precisamos superar o paradigma da separação e internalizar a interdependência. Para não sermos seres patológicos, precisamos entender que não existe definição de sucesso pessoal que não seja ao mesmo tempo uma definição de sucesso para o todo. Ser é inter-ser.

…. A regeneração é uma prática, é uma vivência que começa com a transformação de quem somos e de como pensamos. É sobre dar uma nova vida a algo que teve a sua essência ou capacidade perdida. É sobre revelar o maior potencial e a melhor contribuição que um sistema vivo pode oferecer, a partir da sua essência, aos demais sistemas vivos com que se relaciona.

O desenvolvimento regenerativo é um método capaz de nos orientar nesse processo de aprendizagem, descoberta e realização. É uma abordagem de vanguarda, o resultado de décadas de experimentação que ajuda comunidades e organizações a assumirem a direção da sua própria evolução.”

  E, o Instituto Ecos na Educação busca uma confluência de correntes conceituais poderosas que incluem a Carta da Terra, o Ser Humano Integral, a Ciência com Consciência e a Gestão Caórdica – todas elas abraçando uma compreensão sistêmica da vida e tendo como meta contribuir para que a Educação brasileira se reconecte com a Natureza. Diante destes grandes desafios, entendemos que devemos somar forças, experiências, conhecimentos que nos permita ir clareando a trajetória do Instituto Ecos na Educação e o IDR tem contribuído para que possamos criar traços mais claros e firmes para a nossa caminhada.

  Neste sentido, retomando a reflexão sobre o Instituto Ecos na Educação compreendemos que seu papel deve ser o de se constituir enquanto um lugar, um espaço-tempo de reflexões e vivências para a comunidade escolar entre as Universidades e as Escolas de Educação Básica, por isso o nomeamos de espaço-tempo entre, que permitirá  construir um profícuo diálogo entre esses diferentes lugares onde há o privilégio do criar e do aprender humanos. Segundo Augusto de Franco, o lugar não é apenas uma localização no espaço, mas uma posição no tempo. Quando uma janela se fecha, ainda que você esteja no mesmo lugar no espaço, não está mais na mesma posição no tempo (ou no espaço-tempo dos fluxos, onde as redes existem propriamente como tais).(1)

  Outro teórico que reflete sobre o papel do lugar como espaço-tempo e, que se demonstra  fundamental para compreendermos a riqueza dos processos de ensino-aprendizagem, é David W. Orr, que no livro Alfabetização Ecológica, diz: “Os lugares são laboratórios de diversidade e complexidade, misturando as funções sociais e os processos naturais. O lugar tem uma história humana e um passado geológico; ele é parte de um ecossistema com uma variedade de microssistemas, é uma paisagem com uma flora e uma fauna particulares. Os seus habitantes fazem parte de uma ordem social, econômica e política: eles importam ou exportam fontes de energia, água e detritos; estão ligados a outros lugares por incontáveis vínculos. Não se pode entender um lugar da perspectiva de uma única disciplina ou especialização. Ele só pode ser entendido nos seus próprios termos como um mosaico complexo de fenômenos e problemas… Se o lugar incluir áreas naturais, florestas, cursos de água e terras cultivadas, as oportunidades de aprendizagem ambiental se multiplicam na mesma proporção.” (2)

   Ainda, dentro dessa compreensão teórica, um conceito importante para  a elaboração destas reflexões é o de Epistemologia dos Nexos, desenvolvido por Maristela Barenco em sua Tese de Doutorado. Para esta autora, ao se buscar a riqueza do lugar e a complexidade que o mesmo implica, precisamos compreender …” a pertinência de uma diversidade de formas de conhecer, de se envolver e de dialogar com a realidade e a vida, como expressão de uma Epistemologia dos Nexos. O que está em questão não é apenas a multiplicidade dos níveis de percepção da realidade, mas também uma multiplicidade dos níveis de percepção do sujeito, todas com potenciais de consolidarem formas legítimas de cognição”. (3)

  Vamos explorar essas reflexões ao longo dos textos desta Série. A saber:

     Série: O espaço-tempo entre. Composta por 04 artigos:

  1. Entre dois mundos. Vamos conseguir?
  2. Direção. O espectador, o participante e o salto mortal. Liderança regenerativa
  3. Traços iniciais: Ricas experiências entre o Instituto Ecos na Educação e às escolas públicas da Vargem Bonita
  4. A práxis educativa: Aprendendo com Paulo Freire, Edgar Morin, Alícia Fernández, Antônio Nóvoa … e outros.

Citações do texto:

  1. No texto: O pior retrocesso é o que está acontecendo na sociedade. Augusto de Franco. In: www.dagobah.com.br
  2. Livro: Alfabetização Ecológica, artigo: O lugar e a pedagogia, p.114 David W. Orr
  3. Mello, Maristela Barenco Corrêa de. Uma educação ambiental como estética da existência e epistemologia dos nexos: uma experiência socioeducativa do Projeto Florescer.